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Um universo dentro de mim

Fui mãe cedo. Não estupidamente cedo, mas cedo. Mais especificamente aos 21. Estava no meio da graduação na UNICAMP. Período integral, trabalhava a noite, das 18h à 00h30, e já tinha minha carga de frustrações para carregar. Meus pais moravam a mais ou menos 1.000km da cidade onde moro. Quando fui visitá-los nas férias de dezembro passei por várias consultas e exames e em um deles recebi o seguinte diagnóstico: “Ou você pára de estudar, ou você pára de trabalhar – os dois, não dá mais”. Não dava para continuar pois segundo o médico meu nível de estresse estava absurdamente alto. Eu precisava parar um pouco (já confesso aqui que “não deu”).

Naquela consulta eu já estava grávida e ainda nem desconfiava. Mas assim que descobri, não havia possibilidade de parar de trabalhar e meu orgulho não me deixava desistir da faculdade. A partir daí minha vida entrou num turbilhão (com alguns momentos de trégua no meio do caminho) e eu fui me desconectando, cada vez mais, de mim e do mundo a minha volta. Fui mergulhando na minha concha e congelei mais profundamente. Sabe o Spock? Do filme Jornada Nas Estrelas? Acho que define bem o estado.

Aos poucos fui voltando. Com terapia, das mais variadas, com muita resistência e com muito medo também. Foi como se eu fosse jogada diretamente de um universo paralelo, onde essa coisa de emoções e sensações praticamente não existiam, para um lugar onde elas estavam por todos os cantos, espreitando, assustadoras e descontroladas.

O que sinto? Aliás, sinto algo?! Desde quando isso existe em mim? Aparentemente faz tempo. Dá pra mudar? Dá pra encaixar? Dá pra abrir uma brecha no peito e deixar tudo passar? Onde isso tudo estava antes que eu não via? Como cabia?

Tenho esperança de conseguir me responder boa parte dessas perguntas e tenho me esforçado para que sim.

Mas, e aí? O que faço agora? Busco. Um pouco mais profundo a cada dia. Um olhar pra dentro e fora de mim, me (re)conhecendo. Busquei com a mesma força com que me mantive congelada, travada. Com o anseio de abrir tudo do dia para noite, cansada do tempo “perdido”.

Sabendo que não é tão simples como apertar um botão, que é trabalhoso, mas desejando que não fosse.

Com muito medo do processo, apegada e acomodada com o que achava que já sabia sobre mim e minha vida, fui me trabalhando internamente. Já se passaram mais de 8 anos desde que decidi, com propósito, voltar para mim mesma, me (re)descobrir. Nesse meio tempo me formei psicanalista. Participei de círculo de mulheres, facilitei e participei de grupo de estudos e autoconhecimento, de vivências e retiros. Nessas experiências descobri elementos importantes sobre mim mesma e aprendi a gostar dos tornados que perpassam a vida, mudando tudo de lugar, me tirando dos trilhos e mudando os caminhos.

Mas, voltando para a tal da “desconexão”. Um dos passos necessários pra esse retorno tem sido descobrir quem eu sou, não apenas emocionalmente, mas também corporalmente. Da ponta do pé ao fio do cabelo. Perguntas bobas como: que tipo de dor você tem? Você tem dores de cabeça freqüentes, cólicas? Quando, e como, foi seu último ciclo? Dorme bem?

Nenhuma delas eu sabia responder… Se tenho TPM? Devo ter… Dizem que toda mulher tem. Como está sua libido? Oi, isso existe/é real – não é lenda do Freud?

Com a percepção de que não conseguia responder a essas e outras perguntas sem um grande ponto de interrogação na minha testa, é que a ficha começou a cair: sim, o buraco era bem mais embaixo. Não bastava elaborar, entender, ser paciente, persistente, disciplinada…

Precisava de algo mais básico. Saber os limites do meu corpo. Saber onde eu começava e terminava. Perceber meus pés tocando o chão ao caminhar e qual movimento eles faziam para isso. Saber o que gostava e não gostava. Saber o que doía e o que causava prazer. O que queria e o que NÃO queria (o “não” também era importante).

Seria impossível abrir qualquer espaço dentro de mim sem conhecer cada pontinho desse corpo que habito. E, por incrível que pareça, esse está sendo um desafio maior que todos os outros. Aqui, a resistência é grande. Intelectual que sou, fui ler a respeito. Li bastante e tentei, observei e senti várias técnicas sugeridas. Um dos movimentos que me ajudou nessa abertura de espaço eu encontrei no comecinho do livro “Desvendando o poder oculto da sexualidade feminina”, da Maitreyi D. Piontek*. Trata-se de uma meditação para centramento e conexão com o Tan T’ien inferior (mais ou menos na região do segundo chacra, um pouquinho acima), com nosso útero e nossa sexualidade. Com a criatividade e prazer na vida.

  1. É o seguinte:

  2. Sente-se ou fique em pé, com as costas retas e relaxadas e feche os olhos.

  3. Coloque a mão direita abaixo do umbigo e a esquerda nas costas, na posição oposta à da mão direita, as palmas voltadas uma para a outra.

  4. Inspire profundamente pelo nariz e ao expirar faça com que toda a sua energia flua para seu centro.

  5. Una-se e entregue-se ao seu centro, cada vez mais profundamente, até que possa sentir o sangue vibrando nesse ponto.

  6. Deixe que essa vibração a leve mais profundamente a procurar e revelar o seu centro.

Maitreyi orienta a fazer o exercício sempre que puder, onde quer que esteja. Segundo ela, assim que for possível para você estar centrada consigo mesma, com ou sem o exercício que aprendeu acima, você poderá gerar uma sensação de calor e energia no seu centro.” Esse processo poderá levar semanas ou meses, não tenha pressa…

Ainda estou aprendendo a soltar, aceitar e me centrar, mas confesso que estou apreciando muito a viagem. Deixo aqui um convite explícito a todas que se percebem atordoadas, anestesiadas, a dar um passo firme em direção a si mesmas. Vale a pena – e há vários caminhos para isso. Seja bem-vinda de volta a você!

OBS: Essa meditação é boa, mas sinceramente, recomendo o livro todo. É um livro para ser “degustado”, no seu tempo, e não “engolido”. Lá a autora propõe vários exercícios e meditações para esse caminho de reencontro interno, e o ritmo é individual (cada uma de nós tem seu tempo, que precisamos aprender a respeitar se quisermos uma vida com um pouco mais de profundidade e significado).

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